segunda-feira, 28 de maio de 2012

SOBRE A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA REVOLUÇÃO FRANCESA - (1789-1799)


DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER E DA CIDADÃ

“No Ocidente, a luta pela igualdade de direitos e deveres de mulheres e homens vem de longe. Nesta perspectiva, apresentamos aqui a tradução de um corajoso texto/manifesto escrito por uma mulher em 1791, dois anos após a Revolução Francesa, há, portanto, mais de duzentos anos.
A autora da Déclaration des droits de la femme et de la citoyenne (Declaração dos direitos da mulher e da cidadã) é Marie Gouze, mais conhecida como Olympe de Gouges (1748-1793).
Em 1793 ela foi guilhotinada em Paris. E a condenação deveu-se ao fato de ela ter-se oposto aos conhecidos revolucionários Robespierre e Marat, que a consideraram mulher “desnaturada” e “perigosa demais”. Ao ser conduzida à morte, Olympe de Gouges teria afirmado: “A mulher tem o direito de subir ao cadafalso; ela deve ter igualmente o direito de subir à tribuna”.
Foi com o nome de Olympe de Gouges que esta filha de um açougueiro do sul da França assinou suas dezenas de peças de teatro e panfletos, revelando e propalando o seu entusiástico apoio à Revolução Francesa (1789). Dois anos depois da Revolução, em 1791, Olympe de Gouges ousa propor uma Declaração dos direitos da mulher e da cidadã, com uma dedicatória à Rainha, Maria Antonieta, esposa de Luís XVI.
O documento é encaminhado à Assembleia Nacional da França, para que fosse aprovado, como havia ocorrido com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (agosto de 1789). Esta declaração inspira os 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela ONU em 1948, e depois assinada por um número crescente de nações. A Declaração escrita por Olympe de Gouges contém 17 artigos, marcando ainda mais seu caráter de crítica ao documento anteriormente aprovado pela Assembleia Nacional da França, servindo ao mesmo tempo como apelo às mulheres para que elas se posicionassem responsavelmente frente ao que (lhes) acontecia."



DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER E DA CIDADÃ
Olympe de Gouges


Preâmbulo


As mães, as filhas, as irmãs, representantes da nação, reivindicam constituir-se em Assembleia Nacional. Considerando que a ignorância, o esquecimento, ou o desprezo da mulher são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governantes, resolverem expor em uma Declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis, e sagrados da mulher, a fim de que esta Declaração, constantemente, apresente todos os membros do corpo social seu chamamento, sem cessar, sobre seus direitos e seus deveres, a fim de que os actos do poder das mulheres e aqueles do poder dos homens, podendo ser a cada instante comparados com a finalidade de toda instituição política, sejam mais respeitados; a fim de que as reclamações das cidadãs, fundadas doravante sobre princípios simples e incontestáveis, estejam voltados à manutenção da Constituição, dos bons costumes e à felicidade de todos.
Em consequência, o sexo superior tanto na beleza quanto na coragem, em meio aos sofrimentos maternais, reconhece e declara, na presença e sob os auspícios do Ser superior, os Direitos seguintes da Mulher e da Cidadã:


ARTIGO PRIMEIRO
A mulher nasce e vive igual ao homem em direitos. As distinções sociais não podem ser fundadas a não ser no bem comum.

II
A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis da mulher e do homem: estes direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança, e sobretudo a resistência a opressão.

III
O princípio de toda soberania reside essencialmente na Nação, que não é nada mais do que a reunião do homem e da mulher: nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que deles não emane expressamente.

IV
A liberdade e a justiça consistem em devolver tudo o que pertence a outrem; assim, os exercícios dos direitos naturais da mulher não encontra outros limites senão na tirania perpétua que o homem lhe opõe; estes limites devem ser reformados pelas leis da natureza e da razão.

V
As leis da natureza e da razão protegem a sociedade de todas as ações nocivas: tudo o que não for resguardado por essas leis sábias e divinas, não pode ser impedido e, ninguém pode ser constrangido a fazer aquilo a que elas não obriguem.

VI
A lei dever ser a expressão da vontade geral; todas as Cidadãs e Cidadãos devem contribuir pessoalmente ou através de seus representantes; à sua formação: todas as cidadãs e todos os cidadãos, sendo iguais aos seus olhos, devem ser igualmente admissíveis a todas as dignidade, lugares e empregos públicos, segundo suas capacidades e sem outras distinções, a não ser aquelas decorrentes de suas virtudes e de seus talentos.

VII
Não cabe exceção a nenhuma mulher; ela será acusada, presa e detida nos casos determinados pela Lei. As mulheres obedecem tanto quanto os homens a esta lei rigorosa.

VIII
A lei não deve estabelecer senão apenas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido a não ser em virtude de uma lei estabelecida e promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada as mulheres.

IX
Toda mulher, sendo declarada culpada, deve submeter-se ao rigor exercido pela lei.

X
Ninguém deve ser hostilizado por suas opiniões, mesmo as fundamentais; a mulher tem o direito de subir ao cadafalso; ela deve igualmente ter o direito de subir à Tribuna; contanto que suas manifestações não perturbem a ordem pública estabelecida pela Lei.

XI
A livre comunicacão dos pensamentos e das opiniões é um dos direitos os mais preciosos da mulher, pois esta liberdade assegura a legitimidade dos pais em relação aos filhos. Toda cidadã pode, portanto, dizer livremente, eu sou a mãe de uma criança que vos pertence, sem que um prejulgado bárbaro a force a dissular a verdade; cabe a ela responder pelo abuso a esta liberdade nos casos determinados pela Lei.

XII
A garantia dos Direitos da mulher e da cidadã necessita uma maior abrangência; esta garantia deve ser instituída para o benefício de todos e não para o interesse particular daquelas a que tal garantia é confiada.

XIII
Para a manutenção da força pública e para as despesas da administração, as contribuições da mulher e do homem são iguais; ela participa de todos os trabalhos enfadonhos, de todas as tarefas penosas; ela deve, portanto, ter a mesma participação na distribuição dos lugares, dos empregos, dos encargos, das dignidades e da indústria.

XIV
As Cidadãs e os Cidadãos têm o direito de contestar, por eles próprios e seus representantes, a necessidade da contribuição pública. As cidadãs podem aderir a isto através da admissão em uma divisão igual, não somente em relação à adiministração pública, e de determinar a quota, a repartição, a cobrança e a duração do imposto.

XV
A massa das mulheres integrada, pela contribuição, à massa dos homens, tem o direito de exigir a todo agente público prestação de contas de sua administração.

XVI
Toda sociedade, na qual a garantia dos direitos não e assegurada, nem a separação dos poderes determinada, não tem qualquer constituição; a constituição é nula, se a maioria dos indivíduos que compõ a Nação não cooperam à sua redação.

XVII
As propriedades pertecem a todos os sexos, reunidos ou separados; constituem para cada um, um direito inviolável e sagrado; ninguém disto pode ser privado, pois representa verdadeiro patrimônio da natureza, a não ser nos casos de necessidade pública, legalmente constatada, em que se exige uma justa e prévia indenização.


Conclusão
Mulher, desperta-te; a força da razão se faz escutar em todo o universo; reconhece teus direitos. O poderoso império da natureza não está mais envolto de preconceitos, de fanatismo, de supertisção e de mentiras. A bandeira da verdade dissipou todas as nuvens da tolice e da usurpação. O homem escravo multiplicou suas forças e teve necessidade de recorrer às tuas, para romper os seus ferros. Tornando-se livre, tornou-se injusto em relação a sua companheira.
Oh mulheres.

A ‘Apresentação’ e tradução para língua portuguesa deste texto é de Selvino José Assmann, doutor em Filosofia (Pontificia Università Lateranense, PUL, Itália), professor titular em Filosofia da História do Departamento de Filosofia (UFSC), professor do Doutorado Interdisciplinar do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (UFSC).
Fonte: «http://www.floripatotal.com»

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